Relatório entregue ao STF aponta espionagem ilegal contra adversários e proteção de aliados no caso Flávio Bolsonaro
A Polícia Federal indiciou o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL-RJ), seu filho e vereador Carlos Bolsonaro (PL-RJ) e o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), entre outros, por suspeita de uso indevido da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) para monitorar ilegalmente adversários políticos, membros do Judiciário e jornalistas. O relatório da investigação, com mais de 800 páginas, foi entregue ao Supremo Tribunal Federal (STF).
Além das acusações de espionagem política durante o governo anterior, o inquérito também detalha manobras para blindar aliados do ex-presidente, como o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), investigado por suposto envolvimento em um esquema de rachadinha na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), quando era deputado estadual.
Um dos trechos mais comprometedores do relatório remete a uma gravação vazada em julho de 2024. O áudio, registrado ainda em 2020, traz Jair Bolsonaro em conversa com Alexandre Ramagem — então diretor-geral da Abin — e advogadas de Flávio. Na reunião, discutia-se abertamente o monitoramento de auditores da Receita Federal que atuavam no caso da rachadinha.
Segundo a PF, o conteúdo do diálogo é claro:
“Se instaurar um procedimento administrativo contra esses auditores, eles saem da função”, disse Ramagem, sugerindo interferência direta na estrutura da Receita.
Ramagem é apontado como peça-chave do esquema, acusado de instrumentalizar a agência de inteligência para fins pessoais e políticos. Já Carlos Bolsonaro, de acordo com a investigação, teria atuado na articulação e orientação das ações de espionagem.
Entre os alvos das escutas e monitoramentos ilegais estariam ministros de tribunais superiores, parlamentares, jornalistas e servidores públicos — especialmente aqueles considerados obstáculos aos interesses da família Bolsonaro.
A lista de indiciados inclui ainda o atual diretor-geral da Abin, Luiz Fernando Corrêa, nomeado pelo presidente Lula (PT), mas que já ocupava altos cargos na estrutura de inteligência desde governos anteriores. A PF o acusa de tentar interferir nas investigações, protegendo servidores envolvidos nos atos ilegais e atrapalhando a apuração dos fatos.
O inquérito se arrasta há mais de dois anos e teve sete operações autorizadas pelo STF. Ao longo do processo, agentes de carreira da Abin também foram indiciados por terem, segundo a polícia, cedido à influência de policiais federais ligados ao entorno bolsonarista.
A gravidade das acusações coloca pressão sobre o Congresso e o Supremo. A Procuradoria-Geral da República deve se manifestar nos próximos dias sobre o pedido de medidas cautelares, que podem incluir o afastamento de Ramagem do cargo parlamentar, a depender da análise do ministro relator do caso.
Enquanto isso, no ambiente político, o caso acirra ainda mais os ânimos entre oposição e governo — não apenas pelo conteúdo do escândalo, mas pela possibilidade de desdobramentos que atinjam diretamente os planos eleitorais de figuras centrais do bolsonarismo.